Em
um dia lindo, em uma pequena cidade medieval. Andava um andarilho perto de um
palácio a cantar. Feliz por não ser um andarilho triste.
Andarilho
– Eu ando por aqui e por ali,
Sem
complicações,
Todo
contente, todo feliz... Lá, lá, lá, lá, lá!
Sou
um andarilho feliz.
Em
seu jardim o rei ouve o andarilho e caminha em sua direção.
Rei
– Jovem!
Andarilho
– Sim?
Rei
– O que estava a cantarolar?
Andarilho
– Que sou um andarilho feliz! Por quê?
Rei
– Você realmente é um andarilho?
Andarilho
– Sim, eu não tenho casa fixa para morar! Ando de cidade em cidade sem
complicações!
Rei
– Impossível... Isso é impossível! Não acredito que isso possa acontecer!
Andarilho
– Acontecer, o quê?
Rei
– Uma pessoa não ter casa e ser mais feliz do que eu, que tenho tudo!
Andarilho
- Mas não se preocupe um dia você encontrará o motivo de sua felicidade!
Rei
– Você é um jovem de bom coração?
Andarilho
– Sim, eu acho! Por quê?
Rei
– Poderia me doar um pouco de sua felicidade!
Andarilho
– Impossível! Olha vou lhe dizer... O motivo de ter sua felicidade está de
baixo de seu nariz! Tenho que ir!
Rei
– Meu jardim?... Não se vá... Preciso ao menos de sua ajuda!
Andarilho
– É simples! Você vê este céu limpo? Esses gramados esverdeados? Essas árvores
encantadoras? E sente o cantar dos pássaros e o cheiro das tulipas?
Rei
– Sim, mas claro... Mas como isso iria me alegrar?
Andarilho
– Já pensou em observar cada detalhe disso tudo?
Rei
– Já observei, já conheço todos os detalhes de cada dia a cada minuto!
Andarilho
– Espera só um minuto... Você nunca saiu desta cidade?
Rei
– É!
Andarilho
– Agora entendo! Você não conhece outras paisagens! Isso aqui é só um pouco da
beleza do mundo!
Rei
– Preciso que me alegre! E não me chateie!
Andarilho
– Tudo bem! Vou lhe contar uma piada!
“Tinha
um caramujo e um esquilo conversando até que um porco-espinho aparece! E então
ele resolve tirar uma com a cara do caramujo, atira-lhe uma pedra... O esquilo
que é rápido segurou a pedra antes que acertasse o caramujo. O porco-espinho
com raiva vira de costas e é amassado porque um andarilho tropeçou nele...”
Há há há!
Rei
– Não entendi!
Andarilho
- É uma piada de andarilho! Vou explicar, o porco-espinho se ferrou e o
caramujo não! Entendeu?
Rei
- Agora entendi! Mas mesmo assim permaneço desanimado!
O
rei procurando uma solução teve uma ótima idéia!
Rei
- Já pensou em morar por essas bandas?
Andarilho
– Sim, mas não tenho lugar! Por quê?
Rei
– Você gostaria de ter uma casa, comida, bebida e permissão para andar por toda
a cidade em troca de assistência?
Andarilho
– Como assim?
Rei
– Quer se tornar meu bobo da corte? E em troca te dou abrigo?
Andarilho
– Não sei! Pode ser! Estou com uma fome!... Eu aceito!
O
rei se animou! Pediu a sua cozinheira para preparar um ótimo almoço pra dois,
para a costureira fazer um traje exclusivo para seu novo bobo, pediu para a
faxineira limpar o maior quarto de visitas do palácio e lá deixar as coisas do
bobo!
Andarilho/Bobo
– Está animado?
Rei
– Sim! Poderás dormir tranqüilo, terás comida garantida e também sapatos novos!
Bobo
– Mas eu gosto dos meus sapatos velhos!
Rei
- Mas esses machucam o pé, e são desconfortáveis! Já providenciei novos! E você
tem nome?
Bobo
– Não! Eu já nasci andarilho, meus pais sumiram na minha infância e então
sempre fui chamado de andarilho!
Rei
– Então terá um novo apelido que será bobo. Mas se eu quiser lhe chamarei de
Andy! Andarilho não é nome digno a um bobo da corte!
Bobo
– Estou grato por tudo! Mas uma pergunta! Qual seria minha função neste palácio?
Rei
– A sim claro! Perdoe-me! Não deve conhecer o que é um bobo da corte! Simples,
você poderá ficar a vontade a maior parte do tempo! Até que eu lhe chame para
me animar!
Bobo
– Muito interessante!
O
rei se animou, mas o andarilho começou a ver aquele palácio como um mundo
escuro! Vazio, sem valor algum para ele!
A
noite rapidamente cai para o bobo, mas para o rei o dia foi tão longo que mau
via a hora do outro dia aparecer!
À
noite o bobo se batia, e tinha pesadelos, então ele acorda desesperado!
Bobo
– Ai! Minha cabeça! Eu não consigo relaxar e nem dormir! Não é a cama e nem o
quarto! O que deve ser?
Abriu
a janela! E viu toda a cidade adormecida... Suspirando comenta!
Bobo
– Que saudade...
Lá
fora era um breu, mas um breu claro para o bobo! Dentro de seu quarto, três
velas acesas, que deixavam o quarto com uma claridade ótima! Mas para o bobo
aquilo era negro, era horrível!
Bobo
– Preciso relaxar, mas não sei como! Estou sufocado! Sem ar!
Era
uma noite agradável, lá fora uma brisa deslumbrante e lá dentro mal havia ar
para o bobo!
Bobo
– Eu quero sair logo deste lugar! Mas não posso! O rei se decepcionaria comigo!
E não quero vê-lo triste! Preciso voltar a dormir! Amanhã será um ótimo dia! Eu
sinto!
O
bobo, com muita dificuldade volta a dormir! E na manhã seguinte, ele desce a
escadaria de cuecas, se senta e come! O rei se assusta com esta cena!
Rei
– Bobo! O que está fazendo?
Bobo
– Tomando café da manhã oras!
Rei
– Mas de cueca? Onde estão seus trajes? Margareth!
Faxineira/Margareth
– Sim majestade?
Rei
– Onde estão os trajes do bobo?
Faxineira/Margareth
– No quarto dele majestade!
Rei
– E o banho está pronto?
Faxineira/Margareth
– A água está fervendo, mas as essências já estão lá!
Rei
– Obrigado! Pode se retirar!
Faxineira/Margareth
– Com licença!
Rei
– Por favor! Nunca mais faça isso!
Bobo
– Isso o que?
Rei
– Descer sem tomar banho e sem estar vestido!
Bobo
– Mas estou com fome!
Rei
– Tudo bem, desta vez perdoarei! Mas na próxima não quero que se repita! Tome
seu café e suba! Tome seu banho e desça vestido!
Bobo
– Tudo bem! Perdoe-me! Poderia lhe fazer uma pergunta?
Rei
– Sim?!
Bobo
– Por que me tratas como um príncipe?
Rei
– Por nada! Quero que se sinta bem!
O
bobo desconfia de tantos agrados, toma seu café bem rápido. E sobe correndo. O
rei se incomodou com a pergunta e se chateia. Chateado nem percebe que o bobo
comeu suas frutas como um animal e subiu a escadaria rapidamente fazendo
barulho.
Depois
de uma hora o rei chama o bobo.
Rei
– Bobo! Por favor! Venha até aqui!
Bobo
– Sim?
Rei
– Vamos à feira! Quero fazer uma caminhada!
Bobo
– Tudo bem! Vou lhe mostrar um atalho pelo bosque! Você irá adorar!
Rei
– Ótimo! Pode se retirar!
Bobo
– Até mais!
O
rei estava na frente do palácio com sua carruagem só a esperar o bobo!
Bobo
– Rei? Aonde você vai?
Rei
– Vamos à feira!
Bobo
– De carroça?
Rei
– Sim! Como iríamos? Há há há!
Bobo
– A pé ué!
Rei
– A pé?
Bobo
– Ué, você não queria ir pelo atalho que passa pelo bosque?
Rei
– Sim!
Bobo
– Então teremos que ir a pé!
Rei
– Mas isso seria muito cansativo para mim!
Bobo
– Pensei que queria caminhar! Ir até a feira de carruagem não é caminhada!
Rei
– Mas eu posso machucar meus pés com as pedras!
Bobo
– Deixa de frescura!
Rei
– Tudo bem! Eu vou a pé! Poderia esperar um pouco para eu guardar a carruagem?
Bobo
– Deixe isso aí! Vamos logo!
Rei
– Espera!
Na
metade do caminho o bobo se empolga e começa a andar mais rápido!
Rei
– Bobo! Espere-me! Estou muito cansado!
Bobo
– Ah deixe de ladainha! Estamos perto do bosque! Anda logo!
O
rei cansado avista o bobo bem longe dele, sentado de baixo de uma árvore, logo
atrás um bosque lindo.
Rei
– Bobo você é brilhante! Este lugar é lindo!
Bobo
– Está mais feliz?
Rei
– Sim! Nem sei mais o que é estar cansado depois de ver essa beleza!
O
rei fica completamente feliz pela beleza que nunca avistara em seu palácio!
Bobo
– Espera aí! Tem mais! Vem comigo!
Rei
– Dá pra você andar mais devagar!
Bobo
– Me desculpe! Às vezes esqueço que você não é costumado a andar!
Rei
– Então vamos mais de vagar porque as pedras machucam meus pés enquanto os teus
são calejados!
Eles
chegaram à feira, felizes por terem admirado tamanha beleza. O bobo cansado e o
rei empolgado. Eles caminham pela feira e compram verduras, frutas e outras coisas.
Na volta o bobo avista um grande amigo.
Bobo
– “Sujera”!
Rei
– Onde está sujo?
Sujeira
– Andarilho! Amigo! Como vai você?
Bobo
– Eu estou bem! Você sumiu!
Sujeira
– Eu não! Foi você, isso sim! Dá-me um abraço, velho amigo!
Rei
– Bobo, solte este mendigo, vai sujar seus trajes!
Bobo
– Mas rei, eu também já fui assim! E ele é meu amigo!
Sujeira
– Andarilho ele é o rei? Você é amigo do rei? Você é o bobo da corte do rei? Desculpe-me
majestade!
Rei
– Tudo bem! Vocês foram amigos de verdade?
Sujeira
– Somos amigos!
Rei
– Certo! Vou deixá-los conversar!
Bobo
– E então amigo, vai ficar quanto tempo por aqui?
Sujeira
– Não sei, mas um bom tempo. Tem uma fazenda com milharal aqui do lado. Nessa
cidade não passo tanta fome. Vou ficar por aqui até que o dono da fazenda
descubra!
Bobo
– Que ótimo! Bom amigo, veremo-nos por aí! Tenho que voltar ao palácio!
Sujera
– Foi bom revê-lo amigo! Até a próxima! E tenham um bom dia!
Rei
– Vocês se alimentavam roubando verduras?
Bobo
– Sim! Não tínhamos outra maneira!
Rei
– E vocês são amigos há muito tempo?
Bobo
– Sim!
O
rei e o bobo voltam ao palácio. O rei mal abriu a boca. Estava bravo, pois o
bobo havia sujado seus trajes abraçando aquele amigo. O bobo ficou mais feliz,
pois havia encontrado aquele velho amigo de infância que sumira.
Essa
rotina permaneceu por uma semana. O bobo mostrando lugares novos ao rei e passavam
o dia se divertindo. Até que o bobo se cansa das noites quentes e sufocantes e
resolve fugir.
Bobo
– Não agüento mais essa vida! É hoje! É hoje que eu fujo! Vou aproveitar que
sei onde o Sujera está e virar andarilho novamente com ele. Cansei de ser bobo!
Agora que o rei sabe como é estar feliz posso ir. Vou pegar minhas roupas velhas
no lixão e sair pela janela.
Tudo
planejado. Dito e feito, mas na manhã seguinte o rei e todos os empregados
sentiram falta do bobo na casa. Até que o rei procura alguma pista no quarto e
vê os trajes do Bobo em cima da cama, a cama intacta e o banheiro bagunçado,
ele havia pegado toalhas para sair pela janela.
Rei
– Não! E agora? O que eu faço? Ai meu deus! Onde está o bobo? Como irei ver a
felicidade de novo?
O
rei desesperado desce a escadaria correndo e entra na cozinha chamando os
criados!
Rei
– Eu quero que todos vocês cuidem muito bem do palácio, eu vou procurar Andy em
algum lugar dessa cidade!
Ele,
esperto, vai diretamente para a estrada onde há varias fazendas e pode achar o
amigo do bobo.
Depois
de um bom tempo andando sob o sol escaldante vê ao fundo uma pequena fazenda de
milharal!
Destemido
e determinado a achar o bobo e seu amigo entra mato adentro sem medo algum!
Todo machucado por conta do mato, vê Sujera e Andy!
Rei
– Andy, Sujera! Achei vocês!
Sujeira
– Olá rei!
Rei
– Andy por que fugiste?
Andarilho
– Eu não consigo viver com tanta riqueza. Aquilo para mim não é nada.
Rei
– Eu posso dar um jeito, mas eu preciso de você!
Andarilho
– Mas eu não quero!
Rei
– Oh! Tudo bem! Desculpe-me! Eu... Fui um egoísta!
Sujeira
– Rei quer água?
Andarilho
– Sei esse carinho que você tem por mim! Mas agora que eu já lhe mostrei onde
tem felicidade você pode viver sozinho, sem mim!
Rei
– Eu vi a felicidade quando estávamos juntos e não quando saímos pela cidade!
Andarilho
– Por que me trata tão bem?
Rei
– Eu já tive um filho! Com uma mulher. Era infeliz com ela, mas me sentia muito
bem ao lado dele. Até que ele morreu e ela me roubou. Nunca mais fui o mesmo. E
quando você me apareceu, vi a luz da felicidade que tinha com o meu pequeno
Albert!
Sujeira
– Oh! Coitado!
Andarilho
– Meus pêsames! Desculpe-me! Mas você sabe que eu não sou seu filho!
Sujeira
– Pega leve Andarilho!
Rei
– Tudo bem! Mas mesmo assim obrigado! Fazia tempo que eu não tinha boa
companhia.
Andarilho
– Eu não fiz nada a não ser abrir teus olhos! Mas a maior força foi você quem fez
de acreditar no que eu disse!
Sujeira
– Acho que vou chorar!
Andarilho
-... Desculpe-me... Mas não posso mais ficar ao teu lado, preciso seguir a
minha vida...
Rei
– Tudo bem! Até a próxima Andarilho! Adeus garotos! Tomem cuidado, e venham me visitar!
O
rei voltou feliz e decepcionado ao mesmo tempo para o palácio. Feliz por saber
que o Andy estava bem! E decepcionado por não ter mais aquele amigo a seu lado!
Mas já sabia como achar a felicidade.
O
Andarilho seguiu sua vida com seu amigo Sujera, até que um dia o rei recebe a
visita do amigo do Andarilho.
Sujeira
– Olá Rei!
Rei
– Sujera como vai você?
Sujeira
– Eu vou bem! E o senhor?
Rei
– Estou bem também! E o Andy?
Sujeira
– Rei, tenho que lhe contar uma coisa!
Rei
– Pode dizer.
Sujeira
– O Andarilho morreu, mas suas ultimas palavras foram ditas para eu dar-lhe os
seus amados sapatos a você. Acho que ele se sentiu culpado em te deixar nessa
imensa escuridão. Como ele comentava todos os dias.
O
rei pasmo, pega a caixinha com os sapatos e ali cai uma lágrima.
Sujeira
– Me desculpe! Preciso seguir minha vida! Mas ele também gostava de ti amigo!
Rei
– Obrigado.
Após
uma hora o rei deixou o pranto de lado e teve coragem de abrir a caixa e calçar
os sapatos do Andarilho. Neste momento ele se sentiu mais feliz! Pois naqueles
sapatos estavam representados os sentimentos vividos pelo Andarilho e parte de
sua alma se uniu a alma do rei. A partir daí o rei nunca mais usou outros
sapatos, e nunca mais os tirou.
Morreu
com um sorriso no rosto. Aqueles sapados haviam representado a maior parte da
felicidade dos dois. Do seu tempo de vida... O rei havia feito uma declaração
antes de morrer. O herdeiro de seu enorme palácio era o reino, mas 40% foi para
o Sujera, já que não havia mais ninguém para confiar. Deixou em suas mãos o
gerenciamento da enorme riqueza. 40% para um louco eram muito, por isso 5% foram
para cada funcionário. Mesmo 45% sendo utilizado especificamente os outros 55%
seria para o reino. A herança foi dividida entre todos os pobres.
Em
seu testamento deixou claro que gostaria de ser enterrado com os sapatos velhos
e mais nada.
Por
Bárbara Salles Diadami.